sábado, 25 de junho de 2011

VERDADES E MITOS SOBRE OS PERIGOS E O POTENCIAL DA MACONHA


Droga pode causar dependência e ataca pulmões como o cigarro, mas seus efeitos sobre neurônios, memória e aprendizado são exagerados.
Poucos assuntos criam mais controvérsia e geram mais curiosidade do que a maconha, talvez porque se trate da droga ilícita que as pessoas comuns têm mais chance de conhecer ao longo da vida – estima-se que até 4% da população mundial já a tenha consumido.
Mesmo assim, uma cortina de fumaça de desinformação ainda cerca a planta e seu uso. O G1 responde abaixo às dúvidas mais comuns sobre a maconha, utilizando as últimas descobertas de médicos e cientistas para esclarecer quais são os perigos e o potencial da droga.
De cara, é bom avisar: maconha faz mal. Embora não seja muito diferente de fumar um cigarro comum, com os mesmos riscos de câncer e outras doenças relacionadas ao trato respiratório, ainda assim é o tipo de perigo que até mesmo os mais entusiastas do uso médico da planta recomendam evitar.
Também vale lembrar que, como em qualquer área da ciência, esses dados estão sujeitos a revisão constante: o que hoje parece uma certeza pode se revelar um equívoco com estudos mais cuidadosos. Além disso, muitas características da droga e de sua ação sobre o organismo ainda são pouco conhecidas.
Qual a origem da planta?
Conhecida pelos cientistas como Cannabis sativa, a erva parece ser originária das vizinhanças da cordilheira do Himalaia, na Ásia, e é consumida desde tempos pré-históricos. Foi consumida na Índia e na Pérsia antigas e passou a ser usada como narcótico no Ocidente a partir da época das grandes navegações, no século XVI.
Onde se pode consumi-la legalmente?
A legislação mundial ainda é rigorosa em relação à venda em larga escala da planta. Mesmo no país mais liberal do mundo em relação ao tema, a Holanda, só é possível comprar pequenas quantidades (alguns gramas, ou plantas em vasos) para consumo pessoal em lojas especializadas, e ninguém está autorizado a produzir ou vender a droga em larga escala. Legislações parecidas quanto à posse e consumo particulares (mas não quanto à venda pública) estão em vigor na cidade de Denver (Colorado, EUA), no estado americano do Alasca e em dois estados da Austrália.
Por que fumar maconha “dá barato”?
Porque o princípio ativo da droga é, por um acaso incrível, muito parecido com um importante mensageiro químico do cérebro. O princípio ativo, batizado com o indigesto nome de delta-9-tetraidrocanabinol (ou THC, para encurtar), tem estrutura química semelhante à de substâncias que controlam a passagem de sinais entre as células nervosas, os neurônios.
Esse sistema de mensagens do cérebro foi descoberto graças às pesquisas sobre maconha e, em homenagem à droga, foi batizado de sistema endocanabinóide (ou seja, a da “Cannabis produzida dentro” do corpo). O sistema endocanabinóide atua em quase todas as regiões do cérebro, mas o prazer gerado pela droga advém do fato de que ele atua sobre o córtex (a sede da consciência e da razão), a amígdala (ligada às emoções) e o tronco cerebral (responsável pela sensação de dor). É por isso que os usuários relatam experimentar tranqüilidade e bem-estar durante o consumo – as mensagens químicas ligadas à ansiedade ou a dor são barradas pela ação da droga sobre o sistema endocanabinóide.
Maconha pode ser consumida por jovens?
Não. Segundo um dos maiores especialistas no assunto, o neurocientista e farmacologista Daniele Piomelli, da Universidade da Califórnia em Irvine, o cérebro de adolescentes ainda está em formação e o consumo da droga pode ter sérias conseqüências. Entre as diversas estruturas que ainda não estão formadas no cérebro de um jovem está o sistema dopaminérgico, que processa informações de recompensa e está ligado a comportamentos de vício.
O uso causa dependência?
“Existe essa possibilidade”, diz Dartiu Xavier da Silveira, médico e pesquisador da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) e um dos principais especialistas brasileiros em dependência de drogas. “No entanto, aparentemente a proporção dos usuários que se tornam dependentes é semelhante à que se vê entre usuários de álcool, ou seja, cerca de 10%”, afirma ele.
Ela abre o apetite?
Sim. A chamada “larica” (fome acentuada) associada ao uso da planta não é mera lenda urbana. Mais uma vez, a culpa é da ação sobre o sistema endocanabinóide: o THC também mexe com esse sistema no hipotálamo, área do cérebro que regula o apetite. Segundo Roger Nicoll, pesquisador da Universidade da Califórnia em San Francisco (EUA), a comida passa a parecer mais desejável para alguém com “larica”.
A maconha serve de “escada” para drogas mais pesadas?
“Não existe nenhuma evidência sólida disso”, afirma Dartiu Xavier da Silveira. Usuários de cocaína e heroína muitas vezes também usam maconha, mas não há sinais de que a erva abra o apetite do usuário para outras drogas.
Quais são seus efeitos sobre a memória e o aprendizado?
A memória de curto prazo (aquela que nos permite absorver uma informação nova no momento presente) e a atenção ficam realmente prejudicados, mas só há sinais de um dano permanente com o uso contínuo e em grandes doses. Do contrário, deixar de fumar é suficiente para que essas funções do cérebro se refaçam.
Existe uma dose segura para consumo?
“Os estudos ainda estão muito no começo para afirmar qualquer coisa a esse respeito”, diz o médico da Unifesp.
É uma droga que mata neurônios?
Outro mito: a maconha não só não parece danificar diretamente os neurônios como há indícios de que possa impedir a morte dessas células quando elas são danificadas.
É mais ou menos nociva que o cigarro para os pulmões?
“Os efeitos nos pulmões são bastante parecidos com os de um cigarro normal”, conta Dartiu Xavier da Silveira. A diferença, explica o médico, é que raramente um fumante de maconha conseguirá consumir a droga em quantidades semelhantes aos maços diários de um fumante “normal”. Por isso, os danos tendem a ser menores.
Qual é o seu potencial terapêutico?
Similares químicos do THC, entre os quais os conhecidos como dronabinal e nabilona, já estão no mercado e são usados para combater as náuseas associadas à quimioterapia de pacientes com câncer. Testes conduzidos com pacientes de Aids com o mesmo problema também têm mostrado bons resultados.
Outras aplicações possíveis envolvem medicamentos contra ansiedade, analgésicos e até moderadores de apetite. Nesse último caso, a idéia é se inspirar no THC e no sistema endocanabinóide para criar um “antagonista” – uma substância que bloqueie as fechaduras químicas onde essas moléculas se encaixam e, assim, diminua a vontade de comer do paciente.
No futuro, qual é a chance de que fumar maconha seja permitido por razões médicas?
“Há quem defenda simplesmente fumar a maconha com objetivo terapêutico, mas a preferência tem sido pelo uso de comprimidos de THC, que evitam os problemas causados pela inalação da fumaça”, afirma o pesquisador da Unifesp. Mesmo o THC, por si só, não é perfeito: ele tende a ir parar em regiões indesejadas do cérebro, agindo de forma pouca específica e causando efeitos colaterais. Por isso, há também a intenção de criar versões modificadas da molécula para implementar o uso clínico.
FONTE: G1

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